- visualizações

Produtora brasileira de cinema animalista fala sobre projetos e futuro das produções nacionais


2 pessoas agradeceram por este conteúdo.


Bia Dantas é produtora de vídeos e foi uma das idealizadoras da 1ª Mostra Internacional de Cinema pelos Direitos dos Animais em 2009 na cidade de Curitiba. Vegana e ativista, conduz  projeto “O Cinema Animalista e o Movimento Brasileiro pelos Animais’, na Unicamp, sob orientação de Fernão Pessoa Ramos. Bia coordena o Cine VEDDAS, uma mostra mensal de cinema na temática animal em São Paulo, e assina a coluna Cinema Animalista no portal da Agência de Notícias de Direitos Animais – ANDA.

Nesta entrevista, realizada por Leonardo Mendel, ela aborda o cinema animalista, seu trabalho e a produção atual no Brasil.

É possível traçar diferenças entre o cinema que use animais como tema e o cinema animalista?
Sim, o cinema que usa animais pode ser qualquer filme que tenha um animal em cena e pode não ter nada a ver com cinema animalista. A arte que usa animais é mais uma das facetas da exploração animal para entretenimento humano. Eu classifico filmes animalistas como filmes ativistas pelos animais, ou seja, filmes que falam da relação humano e não humano e que apresentam em seu interior a defesa ativista pelos animais.

Como surgiu o interesse pelo cinema animalista?
O interesse em cinema animalista começou quando eu assisti o Terráqueos, a Rosana Gnipper foi a primeira vegetariana que eu conheci, e ela me disse que eu deveria ver esse filme. Foi o pontapé inicial, eu comecei a pensar que ele deveria ser mostrado para mais pessoas. Essa foi a minha motivação primeira: fazer filmes ativistas pelos animais serem vistos. Depois de um tempo comecei a pensar em organizar uma mostra de cinema que só exibiria filmes animalistas. Assim como há mostras de cinema ambiental, eu pensei: “por que não uma mostra de cinema pelos animais também?” Chamei algumas pessoas pra colaborar, como a Carolina Maia, Carlos Túllio, Diana Moro e o grupo Curitiba da SVB, que hoje é o responsável pela Mostra. Muitas pessoas apoiaram a iniciativa, foi uma conjução de apoios que fez a Mostra acontecer praticamente sem recursos financeiros, sem patrocínio, sem cobrança de ingresso, sem arrecadação de inscrições, tudo somente contando com o trabalho, ativismo e boa vontade de cada um ali. Até hoje eu me lembro de ter ficado muito surpresa com a aceitação do público para o tema, e claro, com a adesão de pessoas tão diferentes entre si.

O público se relaciona de forma bem distinta com produções que apenas tenham o animal como tema (estilo sessão da tarde) e com cinema animalista. Existe algum formato ou linguagem que você considere mais efetivo de acordo com os objetivos do cinema animalista?
Não, não sei se há um formato mais efetivo, por que o artista é livre pra estrapolar os limites. Quando a gente fala em cinema ativista e essa relação com a arte, o papel do artista e do ativista ficam embaralhados. Quando um filme é ativista e panfletário demais costuma deixar o lado artístico relegado a um plano menos importante. Acho isso ruim por que precisamos pensar na linguagem criativa, senão vamos ficar fazendo “filmes-palestra” sobre ser vegetariano e isso interessa pro público em geral?

Que produções você recomendaria a alguém que nunca assistiu a algo do gênero?
O “Vegucated” é um filme interessante, primeiro porque acompanha o processo de transformação das pessoas que desejam se tornar veganas, e por isso o filme se identifica diretamente com o público que está começando a pensar no assunto. Também tem o “Jill’s Film”, do John Curtin, ativista inglês que esteve na Mostra e que está em turnê visitando vários grupos e eventos no Brasil. O filme do John tem pontos muito bons, é um filme ativista, é um filme sobre a mães que perdem os filhos, é um filme sobre um pouco da história dos primórdios da ALF. Em uma outra esfera, tem os filmes do Patrick Rouxel. Fiquei muito bem impressionada com o “Alma” e o “Green”. Ele é um francês que está filmando uma trilogia de filmes sobre a destruição das florestas tropicais e veio filmar aqui na Amazônia (Alma). O Green é sobre a destruição das florestas da Indonésia e como isso afeta as populações de orangotangos da região. São filmes muito interessantes e que despertam várias questões pelos animais e meio ambiente. Mas acho que o filme abolicionista que eu realmente queria recomendar ainda não existe, por enquanto.

Como é a sua rotina de trabalho? Avaliar tecnicamente produções com cenas fortes e emocionantes exige alguns cuidados?
O único cuidado que eu tomo é evitar ver os filmes com cenas violentas durante a noite porque é muito perturbador. E eu preciso assistir repetidas vezes, fazer anotações, escrever, refletir. Muitas vezes enquanto escrevo me dou conta de novas conexões e preciso voltar, procurar o trecho, rever. Enfim, é uma rotina exaustiva, emocionalmente falando. Desde quando montamos a Mostra lá em Curitiba eu já sabia que esse seria meu objeto de estudo – e isso foi em 2009.

No dia a dia eu procrastino bastante antes de ver um filme, uma forma de me proteger, eu acho. Mas posso dizer que se comparar a minha reação hoje e minha reação quando vi Terráqueos, certamente eu já passei por um processo de dessensibilização. Hoje é mais difícil eu chorar, é mais um sentimento de indignação. Várias vezes eu penso: “Pronto! Agora eu já vi tudo, não há mais como eu me chocar.” ; ou: “Essa cena é a mais chocante de todas que eu já vi”. Mas passa um tempo e eu preciso mudar de opinião porque a crueldade humana continua me surpreendendo. Sempre há uma nova imagem, um novo relato, uma nova forma de explorar os animais que me tira o chão.

Que novidades podemos aguardar com relação a produções nacionais com tema animalista?
Produções nacionais acho que ainda vão levar um tempo pra acontecer de forma mais substancial. Mas elas estão acontecendo sim. Há ativistas brasileiros fazendo filmes no sistema colaborativo, mas se você pensar profissionalmente falando a coisa fica mais complicada. Em geral, já é difícil alavancar uma produção brasileira. Imagine uma produção animalista, que gera polêmicas e conflitos de interesses. Principalmente se a gente pensar que o cinema brasileiro é subsidiado por incentivo fiscal. Mas isso não quer dizer que seja impossível produzir filmes animalistas profissionalmente; o Quico Meirelles e seu filme “A Galinha que Burlou o Sistema” estão aí pra nos provar que é possível realizar com primor filmes nessa temática. A Nina Rosa, por exemplo, produz audiovisual animalista no Brasil já faz uns 10 anos talvez, e continua produzindo apesar das dificuldades. Acho que ela é a única brasileira que tem uma história consolidada em cinema animalista. Vejo “A Carne é Franca” sendo exibido até hoje, o filme é um ícone, e já tem uns 7 anos que foi feito. Isso é legal, mas também indica que não temos uma produção animalista ainda. Mas novidades surgirão, estamos conquistando espaço.

2 pessoas agradeceram por este conteúdo.

Ir para a capa do Vista-se (clique aqui)

Apoie com R$ 1,00 por mês (clique aqui)

Nossas redes sociais:
Facebook | YouTube | Instagram | Twitter

Publicidade: